segunda-feira, 9 de setembro de 2019

Comer de 3 em 3 horas? Jejum intermitente? E agora, nutri?



Acho que desde que comecei a ler e a entender mais sobre alimentação e nutrição, antes mesmo de ingressar na faculdade, já encontrava por aí a informação de que "devemos comer de 3 em 3 horas". E até hoje, mesmo com tantas coisas novas (e decentes) dentro do mundo da nutrição, algumas pessoas acreditam que precisam comer nesse intervalo, não importa o quê, não importa onde, não importam sinais de fome que o nosso próprio organismo dá.

Eu desconheço qualquer evidência científica que afirme que esse é o "intervalo ideal" de horas para comer. Sempre fiquei me questionando, por exemplo, se eu almoço meio-dia, aí lá pelas 15 horas estaria na hora de comer de novo, porém, se eu estiver no meio de um atendimento, no trânsito, em uma consulta médica ou qualquer outra demanda da vida moderna e só consigo parar 15h30 ou 16 horas... O que vai acontecer? Meu metabolismo imediatamente "buga"? Ora, não é assim que funciona. 

Todo ser humano tem uma necessidade de consumo alimentar que leva em consideração pelo menos o metabolismo basal (mínimo necessário para garantir a nossa sobrevivência para funções básicas do organismo em repouso, como controle da temperatura corporal, batimentos cardíacos etc) e o nível de atividade física. Beleza. Mas eu preciso comer mesmo sem fome? Aí que começamos a entrar em outro ponto, tão falado nos últimos tempos dentro da nutrição comportamental, que é essa percepção dos sinais que o nosso corpo dá. É fome? É vontade de comer? Já estou saciado?

Um problema para algumas pessoas nessa rotina de comer a cada 3 horas é ter que carregar refeições consigo, em especial as intermediárias ("lanches"). Independentemente de comer ou não nesse intervalo, considero interessante, sim, preparar e levar algumas refeições comigo, já que sei exatamente o que estou comendo (ingredientes, higiene na hora do preparo...), economizo em refeições na rua e, na hora de um aperto, por exemplo se eu for demorar a voltar pra casa e tiver fome, tenho algo nutritivo em mãos e não preciso apelar para itens com calorias vazias na rua (lanches de padaria, industrializados como biscoitos ou bolachas...). Ainda assim, esse esquema de andar com as famosas marmitinhas pode ser mais um "problema" na vida da pessoa, pois pode fazer com que esta fique pensando em comida o tempo todo (porque "tem" que cuidar a hora no relógio para comer de novo).

Para fazer um contraponto, não podemos esquecer que também tem se falado muito em "jejum intermitente. Sim, existem algumas evidências interessantes sobre o tema, sendo um dos protocolos mais utilizados o 16/8, ou seja, são 16 horas de jejum e nas 8 horas restantes seriam feitas entre 2 e 3 refeições. Na prática seria assim: almoço meio-dia, mais uma ou duas refeições nas próximas horas, sendo uma delas o jantar em torno das 20 horas. Jejum das 20 horas até o meio-dia do dia seguinte e recomeça o processo. Mas alto lá! Não pense que nessas refeições você pode comer qualquer coisa, "se jogar" em fast food, achando que vai compensar depois pelo jejum. Pelo contrário: nessas 8 horas restantes, quanto mais nutritivas as refeições, melhor! Afinal, é isso que, além de fornecer os nutrientes que o seu corpo precisa, vai te manter saciado durante o período de jejum. Um pensamento comum é achar que se fizer jejum vai morrer de fome, mas se fizer da forma certa, a tendência é que não passe. São incluídos frutas, legumes e verduras, fontes de carboidratos como batata-doce, aipim, cará ou inhame, gorduras como azeite e oleaginosas (castanhas, nozes, amêndoas...) e fontes proteicas (vegetais ou animais, conforme cada caso).

Por mais que possamos encontrar evidências boas, não quer dizer que o método do jejum seja aplicável para TODA E QUALQUER PESSOA, mesmo que bem orientado. Até porque eu também desconheço evidência que diga que jejum é superior à restrição calórica quando se fala em emagrecimento. E aqui eu não falo de restrições malucas, não, e sim daquela coisa básica que acho que todo mundo sabe: comer menos do que gasta, por meio de uma redução adequada de calorias e substituição de alimentos não tão nutritivos por outros de maior qualidade. 

Sabe por que o jejum não é "bom para todo mundo"? Porque temos que avaliar quem é o paciente que está na nossa frente. Vamos imaginar uma pessoa que come bastante ao longo do dia. Não é compulsão alimentar (um comer impulsivo, com sensação de descontrole em um curto período de tempo). Esse paciente chega para uma consulta com o nutricionista, que, antenado nas evidências, prescreve o jejum. Qual a adesão que esse paciente vai ter com o tratamento? Pode ser que dê certo, no entanto, pelo que conheço das pessoas e suas dificuldades de mudar o comportamento alimentar (que não é fácil mesmo, gente!), é bem possível que a pessoa desista de tudo, não retorne ao nutricionista e volte a comer como antes. Isso não é bom para o profissional, que não conseguiu ajudar um ser humano que buscou auxílio, e nem para o paciente, que não teve sucesso na mudança de hábitos.

Do mesmo modo, o comer a cada 3 horas pode não ser a melhor estratégia para todos. Sabe aquele tipo de pessoa que refere que "esquece" de comer? Eu sempre brinco que não entendo como alguém consegue esquecer de COMER (hahaha), mas em atendimento é mais comum do que você pensa. E se o nutri orientar, quase que "obrigando", a pessoa a comer de tanto em tanto tempo (que pode não ser necessariamente a cada 3 horas), a história se repete: paciente desiste e o profissional não conseguiu ajudar aquela pessoa. Neste caso, é melhor orientar bem sobre fome, vontade de comer e saciedade, que pode haver essa flexibilidade de horários. Comer quando tem fome, parar quando está saciado. Parece simples, embora perceba que as pessoas não sabem reconhecer direito esses sinais. É autoconhecimento, é prestar mais atenção no momento das refeições.

Então, qual a melhor rotina alimentar? Sei que isso desaponta muita gente, contudo, em nutrição a resposta para váaaaarias questões é: DEPENDE! Assim como outros colegas, acredito que o melhor tipo de alimentação é aquele que se encaixa nas suas preferências e na sua rotina, aquele que você consegue SEGUIR. Trabalhamos com evidências científicas, mas também temos que ter empatia, buscar humanizar o atendimento! É claro que em toda mudança de hábito em algum momento vai ser preciso abrir mão de certas coisas (cada escolha, uma renúncia, lei da vida!). Aí é preciso ver o quão motivado você está para essa mudança.

Se você tem acompanhamento com nutricionista, sempre converse com o profissional para que ambos cheguem a um consenso do que é melhor naquele momento! Se não tem, lembre-se que informações na internet ou métodos que funcionaram com outras pessoas podem não ser úteis para VOCÊ e não substituem uma consulta! 

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